A cada quinzena,
são publicadas novas lições, dicas e temas para poemas.
Os temas mensais são, inclusive, o maior desafio para os leitores
que admiram o haicai e que, ao abrir uma nova edição do
jornal, procuram avidamente essa seção para fazer a leitura.
Muitas vezes, ter o seu poema publicado entre os haicais dos leitores
é sinônimo de satisfação e alegria. Quando
isso não acontece, ficam no ar as dúvidas: será que
o poema chegou até os organizadores? Será que não
estava bom o suficiente? O que será que aconteceu?
Para responder
a essas e a outras curiosidades do público leitor do Haicai Brasileiro,
tradicional seção do Jornal Nippo-Brasil, nossa reportagem
desta semana conversou um pouco com os organizadores desse espaço
quinzenal publicado neste suplemento.
A
seção
O Haicai Brasileiro
tem história antiga dentro do Jornal NippoBrasil. Inicialmente,
os leitores enviavam os poemas para a residência de Goga Masuda,
mestre do haicai no Brasil e o primeiro selecionador que a seção
teve. Como Masuda morava próximo à sede do jornal, na capital
paulista, o trabalho dos coordenadores da seção era o de
buscar os haicais selecionados para a publicação. Quando
o mestre passou a morar no interior de Minas Gerais, porém, a situação
ficou complicada.
Então,
com a anuência do mestre, passamos a contar com o julgamento de
dois dos mais importantes haicaístas do Grêmio, os quais
também se propuseram a escrever artigos para a seção.
Também na ocasião, combinamos que eu me prontificaria a
buscar as cartas e [agora] também os e-mails na redação
do jornal e encaminhar os haicais para os jurados, fazendo, antes, uma
triagem, conta Alberto Murata, um dos organizadores do Haicai Brasileiro.
É dessa
forma que, atualmente, funciona a estrutura organizacional da seção.
Praticamente todo o trabalho é feito fora da redação
do jornal.
Francisco
Handa
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Edson
Kenji Iura
|
Alberto
Murata
|
Os
organizadores
Francisco Handa,
Edson Kenji Iura e Alberto Murata compõem o trio que recebe, analisa
e seleciona os haicais que serão publicados na seção.
É deles também a tarefa de redigir as colunas História
do Haicai na qual poemas de grandes nomes do haicai no Japão
são traduzidos e explicados e Pétalas ao Vento,
que traz dicas de como produzir haicais, informações sobre
eventos, resultados de concursos de haicais, entre outras informações.
Apesar de há
bastante tempo fazerem parte do universo do haicai no Brasil, os três
colaboradores possuem histórias diferentes. Monge budista da tradição
Zen Soto, Francisco Handa interessou-se pelo haicai na adolescência.
Nessa época, lia e compunha os primeiros versos de poesia.
Meu tio compunha haiku [poema original japonês; haicai é
a nomeclatura abrasileirada], conta. Handa foi um dos fundadores
do Grêmio Haicai Ipê, com Goga Masuda e Roberto Saito, em
1987. Neste caso, a influência de Masuda Goga foi determinante,
relembra.
O técnico
eletrônico Edson Iura juntou-se ao Grêmio Haicai Ipê
em 1991. Numa certa época, tive interesse em escrever poemas
curtos. Ao começar a pesquisar a respeito, descobri o haicai. Fui
apresentado ao Grêmio por Francisco Handa, diz.
E o publicitário,
jornalista e radialista Alberto Murata juntou-se ao grupo também
por intermédio de Francisco Handa, mas o interesse pelo haicai
veio de sua família. Minha irmã mais velha fazia parte
de um haiku-kai [grupo de haicai], recorda.
Os
critérios
Uma das maiores
dúvidas dos leitores-haicaístas reside nos critérios
de seleção dos poemas do haicai dos leitores,
dentro do Haicai Brasileiro. Escolhe-se de acordo com a preferência
de cada selecionador, aqueles que são melhores, tecnicamente, em
sua estrutrura interna e externa. Não apenas isso, mas o que sensibiliza
a partir de uma estética, descreve Handa.
Edson Iura
explica que a seção segue os padrões do haicai tradicional,
priorizando poemas de aproximadamente 17 sílabas, sem rimas, e
que empreguem termos de estação (kigo). Apreciamos
poemas objetivos, sem expressão de sentimento ou julgamento.
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Quantos haicais a seção recebe a cada mês? (Nelson
Savioli - Rio de Janeiro, RJ)
Alberto Murata A média de haicais que passa pelas
minhas mãos é 250 a 300. Faço uma triagem
naturalmente, os dois julgadores não recebem tudo isso para escolher
os melhores trabalhos. Voltando às minhas mãos, tomo a
liberdade de fazer um mix das duas escolhas.
Como anda a atividade dos haicaístas no Brasil? (Marba Furtado
- Brasília, DF)
Handa Podemos dizer que o haicai não é uma
exclusividade japonesa. Nossos trabalhos estão em pé de
igualdade com qualquer outro, no contexto internacional. É claro,
a massificação não quer dizer que houve melhora
da qualidade, servindo mais para a divulgação. Mas a qualidade
aumentou, levando-se em consideração a revelação
de novos autores.
Iura De modo geral, o haicai, como manifestação
cultural, enraizada na tradição japonesa, enfrenta o desafio
de seu abrasileiramento. A nossa coluna é, certamente, o único
espaço de publicação sistemática de haicai
da imprensa brasileira, além de ser também o mais longevo
(desde 1996). Ao incentivar a prática dessa forma poética,
estamos ajudando a forjar os paradigmas necessários à
afirmação da identidade do haicai escrito em língua
portuguesa.
Murata Na medida em que somos uma minoria praticando essa
arte, creio que a difusão está dentro das nossas expectativas.
Por estar diretamente envolvido no processo, acho até que ela
é bastante satisfatória.
Como é feita a escolha dos kigos em cada estação?
(Regina Alonso - Santos, SP)
Edson Iura Os kigos são escolhidos por consenso.
Francisco Handa Cada avaliador pode sugerir os temas.
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Leia atentamente as orientações que são publicadas
na coluna Pétalas ao Vento. Essas informações
também estão arquivadas no link haicai, disponível
no site do Jornal Nippo-Brasil (www.nippobrasil.com.br).
Leia os haicais dos leitores e forme uma opinião crítica
sobre eles, sugere Francisco Handa. De acordo com ele, esse processo
também faz parte do aprendizado.
É muito importante enviar vários haicais. Os organizadores
do Haicai Brasileiro permitem o envio de até nove haicais por mês,
três de cada tema. Edson Iura constatou que, quando o leitor envia
o tanto máximo de poemas, pelo menos um deles é publicável.
Leitores muito parcimoniosos, que enviam apenas um ou dois haicais,
frequentemente acabam sem nenhum deles publicado, comenta.
Preste atenção à forma do poema. Tente alterar o
mínimo possível a estrutura tradicional de 5-7-5 sílabas.
Não se esqueça de obedecer ao kigo solicitado para o tema
do poema. Alberto Murata, responsável pela primeira triagem dos
poemas que chegam para análise, é enfático: O
vocábulo proposto tem que estar explicitado no haicai. Se se está
pedindo vagalume, não se aceita pirilampo. Também não
se permite que, num só haicai, apareça mais de um kigo.
Seja um observador constante e dos acontecimentos diários e procure
compor haicais todos os dias. Segundo Handa, essa técnica ajuda.
Componha todos os dias, componha o haicai do momento, e não
compare os trabalhos compostos, recomenda.
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Edson
Kenji Iura preparou uma bibliografia comentada para quem quer se aprofundar
no assunto.
The haiku handbook: how to write, share and teach haiku, de William Higginson.
Editora Kodansha
Apresentação ao haicai, este clássico traz
história, características, usos, como publicar e até
um plano de ensino para crianças.
Haiku: a poets guide, de Lee Gurga. Modern Haiku Press
Muito mais focado na prática, este livro traz muitos conceitos
e dicas para composição.
Traces of dreams: landscape, cultural memory and the poetry of Bashô,
de Haruo Shirane. Stanford
A partir da obra de Matsuo Bashô, este livro expõe
como o haicai se consolidou como forma poética.
Haikai: antologia e história, de Paulo Franchetti. Editora da Unicamp
Este livro traz uma introdução sobre a história
e a estética do haicai. Encontra-se esgotado, mas ouvi dizer que
uma nova edição está sendo preparada.
Natureza, berço do haicai, de Goga Masuda. Ed. Diário Nippak.
O único dicionário de termos de estação
[kigo] da língua portuguesa. Descreve em verbetes temas da natureza
brasileira classificados por estação. Infelizmente, está
esgotado.
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